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Josana Santos: "Sou uma mulher marisqueira, não só como ofício, mas como resistência"

Atualizado: 2 de set. de 2021

Imagine estar catando mariscos em um dia e no outro iniciar uma carreira como modelo internacional. A baiana Josana Santos viveu esta incrível experiência e, com apenas 17 anos, viu a sua realidade se transformar, desfilando para eventos como o Afro Fashion Day, São Paulo Fashion Week, além de mais recentemente estampar nada menos que a capa da mais respeitada revista de moda do mundo, a Vogue. Neste Dia Internacional da Mulher, o Mar Bahia bate um papo com a modelo e compartilha um pouco desta história inspiradora.

Foto: Antonio Evaristo/Divulgação

MAR BAHIA - De Salinas das Margaridas, na Bahia, para o mundo. Com apenas 17 anos, sua vida deu uma guinada de 360°. Conte um pouco como aconteceu essa transição.


JOSANA SANTOS - Tudo começou quando uma moça da minha cidade me apresentou ao meu agente (Vivaldo Marques), que sempre ia na minha cidade natal, e desta vez foi e me conheceu. Daí começou o processo de me preparar e me apresentar para o mercado. Foi um choque, pois nunca tinha lidado com alguém tão intenso (Risos), que me falava a todo tempo que eu era uma estrela e enfatizava a frase “você é um escândalo e tem uma cara absurda”. Com 17 anos comecei a fechar com agências internacionais, mas só em sair de Salinas para São Paulo já foi uma grande mudança, tanto pra mim, quanto pra minha família. Terminei os estudos, me preparei fisicamente, (sem dietas), porém, cuidei mais da pele, cabelo, e definição mesmo do corpo.


MB - A realidade das marisqueiras, sobretudo na Bahia, é bem difícil. Qual era a sua rotina neste ofício e como tudo isso mudou após sua nova realidade como modelo internacional.


JS - Então... A rotina de uma marisqueira não é algo específico, ou planejado.. Dependemos muito de como o tempo vai estar para facilitar a tarefa, já que precisamos da maré seca para mariscar. Me orgulhava muito disso, já que é uma luta que vem de toda minha árvore genealógica, minha mãe, vó, tias.. todas vieram e foram criadas, através da nossa maré, que Deus nos deu. Se eu estudasse pela manhã, poderia ir à tarde, e se estudasse pela tarde, poderia ir pela manhã (bem cedo).


"Mesmo sendo um ofício tão desvalorizado, as marisqueiras seguem lutando e desfrutando da maravilha que Deus nos deixou, que é a nossa rica maré"

Foto: Reprodução

A partir do momento que me vi com a oportunidade de me tornar uma grande modelo, enxerguei muito mais que um sonho de menina ou beleza e glamour (que todos vêem nessa profissão) até porque nunca foi meu sonho ser modelo, mas vi uma possibilidade de mudar a vida da minha família, em especial minha mãe (que pra mim é a minha referência de mulher, assim como minha vó). Sendo assim, agarrei a chance com força. Quando me mudei para São Paulo, consegui me desenvolver mais, aprendi muita coisa, além de começar a trabalhar. Ainda não estou rica (Risos) , mas já consegui arcar com todos os investimentos que foram feitos pela minha agência e hoje consigo receber por cada trabalho que faço. Meu sonho é dar uma vida melhor pra minha minha família e, quem sabe, um dia levar minha mãe a Paris.


MB - O trabalho com mariscos é feito majoritariamente por mulheres. Você acredita que pode contribuir para dar visibilidade a este ofício tradicional e ainda pouco valorizado pela sociedade?

JS - Sim! Os homens ficam mais responsáveis com a parte da pesca e barcos... e mesmo sendo um ofício tão desvalorizado, as marisqueiras seguem lutando e desfrutando da maravilha que Deus nos deixou, que é a nossa rica maré.


Hoje sou uma mulher com visibilidade e que trago comigo a luta de muitas outras que vieram antes de mim. O mundo precisa saber e entender que podemos TUDO! E quando uma mulher marisqueira tem um certo destaque, como se tornar uma modelo, acredito que o ofício começa a ser mais visto, mais lembrado e mais valorizado.


"Eu não sou uma ex-marisqueira, eu sou uma mulher marisqueira porque acredito que essa luta está no meu sangue, não só como ofício, mas como resistência".

Foto: Vogue/Fernando Tomaz

MB - Qual a sua relação com o mar da Bahia?


JS - Ahh... O mar.. me vem lágrimas nos olhos quando ouço esta pergunta, pois eu tenho muito axé, e o mar é minha fonte de energia, luta e fé. Amo o mar e ser baiana também!




MB - Estamos na Semana Internacional do Dia da Mulher. Que recado você daria para as muitas mulheres, sobretudo jovens e negras, que sobrevivem do mar?


JS - Meninas, LUTEM, e não desistam! Estamos em um país governado por pessoas machistas, racistas, e homofóbicas. Precisamos lutar três vezes mais... Minha mãe e minha vó sempre diziam: “Mariscar educa, alimenta, e ensina” e isso é a mais pura verdade. Eu não sou uma ex-marisqueira, eu sou uma mulher marisqueira porque acredito que essa luta está no meu sangue, não só como ofício, mas como resistência. Independente do cargo, local ou posição que eu esteja.


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